As minhas leituras de Verão I

Vá-se lá saber porquê, vim de férias sem um único livro na bagagem. Talvez pelo cansaço de um ano “empanturrado” de leituras, algumas das quais pouco digestivas. Não me posso queixar, na casa onde estou, e onde passei boa parte dos meus anos de estudante, ainda por cá moram algumas obras que nunca mais tinha tocado desde o tempo em que me vi ‘obrigada’ a lê-las para o estudo da disciplina de Língua Portuguesa. No caso particular da que tenho em mãos, o “Auto da Alma”, de Gil Vicente, tive que estudar para o exame de LP de 10º/11º ano. Foi-me oferecida pela professora da respectiva disciplina de 10º ano, para se redimir de me ter ‘chumbado’ com nota 9. Naquela altura, no início da década de 80 do século XX não se falava em recursos de notas. Hoje, um recurso, com o desempenho escolar que eu tinha tido ao longo do ano, era garantida a minha transição na disciplina. Falei com a respectiva professora depois do exame. Trocámos meia dúzia de palavras, eu era muito tímida, mas estava segura de que merecia passar na disciplina. Ela estava comprometida. Percebi claramente a insegurança das palavras proferidas. Deu-me os parabéns. Senti que ficou aliviada por eu ter conseguido passar no exame e ainda ter dispensado à oral… naturalmente, problemas de consciência. Perdoei-lhe a maldade, não foi erro. De quando em vez lá me lembro mas sem quaisquer ressentimentos. Hoje, porque peguei na obra que reli com gosto.

Aqui ficam umas notas (súmula) sobre a vida e obra do autor:

GIL VICENTE

Vida e Obra

Embora não se saiba exactamente a data e o local de nascimento do autor, é aceite comummente que tenha nascido entre os anos de 1465 – 1466, muito possivelmente em Guimarães. Descendente de uma família de ourives, partiu bem cedo para Lisboa e aí recebeu formação intelectual e moral. A tendência para as ciências teológicas e filosóficas levou-o a satirizar os aspectos que mais se evidenciavam na sociedade do seu tempo.
Alimentava-o também o gosto pela arte e o ofício de ourives, devendo-se-lhe, sem certeza, a concepção e execução da famosa Custódia de Belém.
Morreu em Évora em finais de 1536 ou início de 1537. Os restos mortais encontram-se no mosteiro de S. Francisco.
Dramaturgo conhecido em todo o mundo. Entre nós, autor de obras de leitura obrigatória do ensino secundário.
A sua carreira de dramaturgo foi encetada em 1502 com o Auto da Visitação ou Monólogo do Vaqueiro, representado para a família real. D. Leonor, viúva de D. João II, incita-o a prosseguir.
A compilação das Obras de Gil Vicente foi feita pela primeira vez em 1562, por iniciativa dos seus filhos. Repartem-se por 5 livros:
1) Obras de Devoção (hieráticas) 17
2) Comédias 4
3) Tragicomédias 10
4) Farsas 12
5) Trovas e obras miúdas 11
O total de peças de teatro desta compilação, mais quatro que foram editadas posteriormente, ascende a 47.
Das características das suas obras ressalta a crítica social – o autor satiriza todos os aspectos que reputa censuráveis na sociedade, mesmo nos membros do clero e da nobreza.
Utiliza um estilo vivo e realista, traduzido em linguagem popular. Nele abundam palavras adequadas às personagens das várias categorias sociais. Por isso, a linguagem, ora se torna abstracta (ex. autos de devoção), ora desce aos vocábulos mais baixos do calão e do plebeísmo. Embora a sua obra pertença já à fase do Português Moderno, conserva ainda muitos arcaísmos, mas não vamos entrar por aqui.
Gil Vicente não aderiu ao Renascimento, naquilo que ele representa de retorno à cultura clássica e no facto reside, em grande parte, a razão de ser do seu vocabulário de cunho popular.
Gil Vicente é ainda conhecido como o Fundador do Teatro em Portugal.
*****
Amanhã ou depois postarei sobre o auto da alma.

Obra consultada:
Auto da Alma, Gil Vicente. Edição de Manuel dos Santos Alves. Lisboa, 1979.

Comentários

1/4 de Fada disse…
A nossa profissão é tão desgastante do ponto de vista físico e psicológico que, na maioria dos dias, mesmo quando tenho tempo livre, não consigo ler... Apetece-me mais, antes dos meus filhos chegarem aproveitar um pouco o silêncio a não fazer nada! Mas isto só compreende quem está "dentro do barco"...

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