Andamos a brincar ao faz de conta?

Reflexões sobre evidências que alguns não querem ver.

Por Maria Helena Damião
Professora da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra

Basta de exames fáceis, dizem eles!
Nas entrevistas que se fazem aos alunos à saída dos exames nacionais, sejam elas para a televisão ou para os jornais, ressalta uma coisa surpreendente: a maioria, não arriscando escrever a esmagadora maioria, acha-os fáceis ou muito fáceis; e, mesmo, os que reconhecem não ter estudado ou ter estudado pouco, acham-nos acessíveis.
Este estranho "fenómeno" pode ter inúmeras explicações mais ou menos delirantes: uma é que, sem se darem conta, os jornalistas escolhem os alunos mais aplicados e conscientes; outra é que os alunos estudam muitíssimo e conseguem aceder a um grau de excelência que sustenta a confiança que evidenciam; outra é que o seu optimismo aumenta na mesma proporção do pessimismo dos professores…
Há outra explicação em que algumas associações de professores e especialistas teimam: os exames são, de facto, fáceis. Melhor: são cada vez mais fáceis. E porquê? Para se obterem resultados “agradáveis” e, assim, acreditarmos que a qualidade do nosso sistema de ensino melhora, quando, na verdade, piora. Eu própria, sempre que analiso um exame nacional, tendo a corroborá-la. Mas a tutela desmente-a sistemática e veementemente, alegando que provém de vozes suspeitas, que denotam má vontade, vozes que procuram uma conspiração onde reina a transparência. É certo que os argumentos de que a tutela se socorre não constam da docimologia (estranha palavra que significa estudo dos exames), mas admito que pode guiar-se por outra lógica, ainda que não vislumbre qual. Devo assinalar que este cenário não é exclusivo do nosso país, está bem identificado e caracterizado na literatura internacional.
O que eu de maneira alguma esperava e, certamente, a tutela também não, era que os próprios alunos adoptassem a última explicação que referi e, mais, dissessem "basta". Pelo que ouvi a vários entrevistados, não querem exames que defraudem as suas expectativas; querem exames que meçam o que efectivamente estudam.
Considerando que nos documentos macro-curriculares se frisa a importância de se atender às necessidades, motivações e interesses dos alunos, talvez seja legítimo concretizar esse propósito e rever a exigência dos exames nacionais, como eles, afinal, solicitam.
In De Rerum Natura

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