Educação para a tolerância: equívocos



Como sabemos, a tolerância não é una ideia nova, assim como não é nova a ideia de cidadania que a suporta e que remonta a tempos bem longínquos da antiguidade clássica, na Grécia por volta do séc. V a.c.. A verdade é que ao longo da história da humanidade (desde esses tempos que se perdem na memória das gentes), nunca se perdeu do horizonte a necessidade de ampliar e difundir certos valores tão comummente falados na nossa contemporaneidade como a justiça, a liberdade, a paz, a solidariedade, a tolerância… Porém, de tanto falarmos neles, até à exaustão, quer em contextos político-ideológicos, quer nos midia, quer em contextos educativos, até corremos sérios riscos de os maltratar alterando o verdadeiro significado, a essência dos mesmos.

De todos os valores universais, o valor da tolerância é um dos mais mal tratados e gerador de grandes equívocos, particularmente, no campo da educação.

A tolerância, por norma, em qualquer campo ou área é encarada como um certo respeito pela liberdade do outro e, por isso, quase intocável. Uma espécie de consentimento mais ou menos desregulado do que o outro, subjectivamente, lhe apetece fazer ou dizer, de acordo com o seu quadro axiológico. Um verdadeiro equívoco que importa esclarecer.

Segundo Damião (s/d), a tolerância é uma atitude de abertura, de disponibilidade:

(i) para nos criticarmos
(ii) para criticarmos os outros
(iii) para aceitarmos que os outros nos critiquem

Terá por isso que ser encarada como relevante e essencial e não com a leviandade e ligeireza como habitualmente se faz.

A tolerância decorre, assim, do reconhecimento de que erramos. Sabendo nós que todas as verdades, as certezas pelas quais nos orientamos podem revelar-se frágeis ou até mesmo inadequadas. Assim, segundo a autora:

(1) A tolerância implica modéstia, ou seja, devemos reconhecer que somos muito ignorantes e falíveis.

(2) A tolerância implica honestidade. Esta implica três fases indistintas em termos de ordem temporal, mas todas elas indissociáveis: (a) devemos reconhecer os nossos próprios enganos (erros); (b) temos o dever de avisar os outros quando percebemos que se enganam; (c) devemos agradecer aos outros quando nos avisam que nos enganámos.

(3) A tolerância implica diálogo. Estar abertos ao diálogo, significa estar abertos ao pluralismo crítico. Mas, para evitar equívocos na comunicação, devemos ser o mais possível claros no nosso discurso de modo a permitir a refutação de ideias.

Em suma, devemos ser modestos, honestos e abertos porque a identificação dos enganos (erros) permite a sua correcção e prevenção e conduz a verdades, a certezas, mais adequadas, o que beneficia a Humanidade. Assim, cada pessoa tem a responsabilidade de contribuir, dentro das suas possibilidades, para melhorar o Mundo. Devemos fazer o que nos é possível para evitar errar, mas se identificarmos um engano, devemos assumi-lo e tentar remediá-lo. Por fim, e voltando à ideia inicial, a tolerância não é tolerar tudo de todas as pessoas. Uma coisa que não é tolerável é a intolerância!

Muitas pessoas não são tolerantes porque não aprenderam a ser tolerantes e porque na sociedade vigora a ética da intolerância: os erros são interditos e, portanto, devem ser escondidos pelo próprio e punidos pelos outros.

Deste modo, a Educação, sobretudo as instituições escolares têm um papel fundamental na construção da cidadania, procurando modificar atitudes de intolerância e consolidar atitudes de tolerância. Parece-nos que o sucesso deste empenho passa necessariamente pela demonstração de atitudes de tolerância por parte dos professores. Uma área que aqui deixamos por explorar, mas não menos importante se atender à importância e ao impacto que uma aprendizagem por modelação pode ter no sucesso de uma educação com valores. Uma educação que, como já dissemos noutros lugares, deve começar em casa. A escola nunca substituirá a função da família neste âmbito da educação dos valores… será um complemento e não o substrato do alimento.

Como Voltaire, acredito que é possível melhorar o mundo… se transmitirmos esses valores aos nossos filhos, aos nossos alunos…

Porque “ninguém pode dar o que não possui", "nem colher o que não semeou"… demos o melhor hoje para que o amanhã possa SORRIR :))

«Amanhã tudo será melhor, eis a nossa esperança.»
(Voltaire)

Referência no texto:
Damião, M. H. (s/d). El aprendizaje de la ciudadanía: el investimento en la tolerancia. Comunicação ao Congresso ALEP (Espanha).

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